Por Júnior Rafael
Na Guiné-Bissau, ser activista é ser sobrevivente — não só de um sistema político corroído por décadas de instabilidade, mas também de uma geografia da negligência. Um país onde até os sonhos precisam pegar carona em aviões que partem de outros lugares, porque sequer um aeroporto internacional funcional serve como porta de entrada ou de saída para a juventude que quer mais. Para sair da Guiné-Bissau, o guineense precisa antes sair de si — deixar para trás a terra natal e seguir por terra até o Senegal ou Gâmbia, para então embarcar num voo que o leve a algum lugar onde ser ouvido seja uma possibilidade concreta.
O activista guineense não enfrenta apenas a repressão directa do poder, mas também um silêncio estrutural, um abandono programado. As universidades são poucas, frágeis, sucateadas. Não conseguem absorver nem a sede de saber da juventude, tampouco oferecer o mínimo de formação que torne os gritos de mudança mais articulados e perigosos ao status quo. Quem sonha em estudar precisa de muito mais do que notas boas: precisa de paciência de monge, coragem de mártir e sorte de quem já nasceu fora.
E mesmo aqueles que ousam erguer a voz em meio ao caos institucional vivem sob constante ameaça. Ser activista na Guiné-Bissau é andar na linha ténue entre a liberdade e a perseguição. É fazer denúncias pelas redes sociais, porque os jornais são silenciados. É organizar manifestações sabendo que não há garantias, que a polícia pode calar com chambocos o que não quer escutar com ouvidos. E ainda assim, eles resistem. Os jovens guineenses não desistem. Fundam colectivos, promovem debates, fazem rodas de conversa em escolas — às vezes sem luz, às vezes sem carteiras, mas sempre com esperança. São jovens clandestinos no seu território.
Se ousar falar ou criticar o governo ou a inoperância do governo, logo recebe uma visita dos sipaios fardados para umas porradas bem sissocoadas. É um clima tenso. Muitos jovens, ao saírem do país, preferem não voltar, devido à dureza do modelo de governação e falta de garantias sobre o futuro e a segurança. Aliás, boa parte dos países africanos agem assim. Guiné-Bissau parece quintal de Sissoco — onde a vontade de um homem vale mais que a Constituição, e onde o medo é a linguagem mais falada.
Enquanto o mundo gira e esquece a Guiné-Bissau em algum canto do Atlântico, esses activistas seguem remando contra a maré da invisibilidade. Lutam não apenas por democracia, mas por dignidade básica: energia estável, hospitais que funcionem, universidades que formem, um aeroporto que conecte. Lutam, sobretudo, por um país que os reconheça.
A dura realidade do activismo na Guiné-Bissau é também uma lição de coragem. Uma coragem silenciosa, cotidiana, persistente. Que não ganha manchetes, mas alimenta, dia após dia, a chama de um futuro que ainda teima em nascer.
Para quando África? Para quando a liberdade? Como pôr fim o neocolonialismo na África lusófona?