Por Júnior Rafael
Bissau, 2025. Calor, poeira e política — os três elementos que não falham nunca. Esta semana, um novo ingrediente foi jogado na panela de pressão da nossa realidade nacional: o corpo de Mamadu Tano Bari, segurança presidencial, foi encontrado boiando no Rio Mansoa. E cá entre nós, o que tem boiado ultimamente na Guiné-Bissau não é só cadáver — é também a nossa paciência, a nossa esperança e, claro, a ideia de que vivemos num país sério.
Tano Bari era segurança do Presidente. Isso mesmo, da pessoa que teoricamente é a mais protegida do país. Agora veja bem: se até o segurança do chefe do Estado é perseguido e depois aparece morto, imagine você, caro leitor, que não guarda nem a porta da sua casa direito porque a fechadura está com defeito desde 2002.
Mano Bari, vítima do sistema ou sistema da vítima?
A família fez uma conferência de imprensa — o que já é um feito heróico por aqui. Disse que Tano vinha sendo ameaçado por colegas. Veja que refinamento! Nem precisaram chamar os inimigos. Em Bissau, parece que o perigo mora mesmo é na copa do lado, na sala ao lado, no carro da frente. Um tipo de “amizade letal” que só as instituições do Estado conseguem cultivar com tanto talento.
E antes que alguém diga que estamos a exagerar, basta olhar o contexto: o irmão dele, Tcherno Bari, está detido há mais de um mês no Estádio Maior. Sim, isso mesmo: estádio. Onde outros países jogam bola, nós jogamos gente. Não se sabe se é prisão preventiva ou apenas um retiro espiritual forçado com vista para arquibancadas vazias.
A pergunta que fica no ar é: quem será o próximo? Porque nesse país parece que há mais rota para desaparecer do que para ser promovido. Entrar no serviço do Estado hoje em dia é como entrar num daqueles reality shows de sobrevivência, só que sem câmara, sem prémio e, às vezes, sem volta.
Claro, tudo isso seria trágico, se não fosse cómico. Ou melhor: é trágico e cómico ao mesmo tempo — como uma peça mal escrita que já passou do terceiro ato, mas ninguém se levanta para aplaudir porque está todo mundo cansado, assustado ou preso.
Afinal, qual é o recado que o Estado nos passa quando um dos seus próprios homens de confiança vira estatística flutuante num rio? Que devemos continuar a confiar? Que tudo está sob controlo? Se isso é controlo, então os crocodilos do Mansoa estão a coordenar melhor do que muitos ministros.
Mas vamos manter o optimismo: talvez essa morte, como tantas outras, seja só mais um “acidente” inexplicável, desses que acontecem quando o sistema escorrega e cai em cima das pessoas erradas. Ou certas. Depende do ponto de vista de quem está no topo da cadeia alimentar estatal.
Resta rir. Porque o riso, cá entre nós, é uma das poucas liberdades que ainda não foi detida. Pelo menos, não por enquanto.
E a memória de Tano Bari? Que sirva para nos lembrar que nesta nossa Guiné, onde os peixes grandes nadam livres e os pequenos são engolidos pelo silêncio, a verdadeira segurança ainda está por ser inventada.
Descanse em paz mano Bari, brevemente nos vemos. Se fizeste seu trabalho certo ou errado, cabe a Deus julgar.