Comunicar para Mudança

O drama de quem viveu de quase todo tipo de violência

No interior de Bebedo, em Nhamatanda, província de Sofala, Maria José, de 39 anos de idade é uma em cada três no mundo que já foi vítima da Violência Baseada no Género. A mulher já passou experiências de violência sexual, física e psicológica praticada pelo ex-marido. E dos seis filhos juntos, nenhum deles usou roupa que o pai Marcos comprou ou que tirasse dinheiro para tal, mesmo com salário mensal.

Esta descrição envolve nomes fictícios para preservar a identidade dos envolvidos, mas os detalhes são contados na primeira pessoa.

Marcos é trabalhador do Parque Nacional da Gorongosa e recebe salário acima de 9.000 meticais. O homem de 42 anos de idade, passou a drogar-se excessivamente e a envolver-se a mulheres. Mas antes do emprego e filhos, aparentava ser o marido que toda mulher sonha. E dos sogros, até chegou de receber apoio financeiro para negócio por bom comportamento e por estar com Maria sendo a primeira sorte dos agora oito filhos do casal Bonga.

Maria José era a única mulher de Marcos. Casou aos 18 em 2002 anos por seguir ideias das outras, não estudar. “Preferi casar para ter único homem”, foi assim que abandonou a 5ª Classe para os braços do homem. Tudo brilhava, no começo.

O negócio foi à falência ao começar investir noutras mulheres. Em 2007 depois, conseguiu emprego onde até hoje trabalha, depois de sete relacionamentos que não deram certo. Mas a primeira esposa foi Maria e a única até ao momento com mais filhos, seis, sem responsabilidade do pai apesar do salário.

Suspeita-se que Marcos não esteja de boa saúde depois de vários casos amorosos. Por conta disso, na sentada com estrutura local, pediram que marido e mulher fizessem testes, mas o homem recusou.

Maria já tentou suportar, mas viu-se obrigada a exigir despesas. “Todos filhos não sabem o que é apoio de um pai, porque nunca o tiveram”.

A dúvida de estado de saúde do homem e a exigência de despesa foram alguns motivos que Marcos invocou para separação. “Vai procurar homem que vai-te dar despesa”, conta Maria na voz do homem.

Dai Maria aceitou, pois, fazia negócio em Bebedo para sustentar os filhos.

“O engraçado é que ele [homem] sempre gastou fora, não apoiou em casa”. Maria quando aceitou a separação, o marido alegou desprezo.

Maria conta que foi obrigada tantas vezes a fazer sexo com o marido, chegando a agressão física e psicológica. Para satisfazer ao homem na altura dos factos, ela fortificou a ideia de juntos fazerem testes de todo tipo no hospital, mesmo assim ela recusou.

Das sentadas com as duas famílias, Marcos apenas reconhecia o erro pela boca, as acções eram contrárias. Nada restou para Maria, senão separação.

A experiência pode estar a ser vivida com mulheres ou até homens. Contra isso, Maria aconse­lha que haja denúncias para uma solução a partir de famílias, alegando que casamento não é prisão. Mas apesar da força de falar, continua com medo de recorrer à autoridade para responsabilizar a custódia do ex-marido desde 2020 pelo menos aos três filhos que no próximo ano vão estudar a 7ª Classe e os restantes dois 1ª Classe, já que a mais velha já não estuda.

Maria, antes de separar, gravou informações do homem, na mente: “quando você me deixar, não vai fazer filhos”.

Agora, Maria projecta mais filhos com o novo homem que também tem os dele no mesmo quintal com outra mulher.

Afinal, a apreciação entre Maria e o vizinho que deu a nova relação, começou quando Marcos primeiro marido dela a maltratava. Depois da separação, foi a vez desses dois que há tempo se apreciavam.

Maria ainda não tem filho na nova relação, e duvida que seja a concretização das palavras do Marcos. “Ainda ouço no bairro que ele diz que não vou fazer filho com outro homem. Estou a planificar mais uma reunião familiar sobre essas palavras”.

 

Como é a vida de Marcos agora?

Não se sabe exactamente quantas mulheres Marcos assume actualmente. O homem é possível ser visto em duas mulheres em Bebedo e Nhampoca, dentro do distrito de Nhamatanda, mas o lugar mais fácil de lhe encontrar é onde fazem bebida tradicional. Nas bebedeiras, os que lhe apreciam vão lhe mimando, uns acendem o cigarro para ele, outros servem o álcool, enquanto alguns puxam o papo. Assim vai o luxo em tempos de salário.

Maria reconhece que quando Marcos começou a trair, não o impediu, achando que na qualidade de homem, podia o fazer como é mentalmente interpretado por alguns, localmente. Mas, hoje, a mãe de sete filhos arrependeu-se, por isso, quebrou o silêncio.

Hoje, Maria roga que o pai dos seis filhos apenas venha a assumir a paternidade, não apenas nos documentos.

O “Profundus” sabe que Marcos quer que os filhos vivam com ele na madrasta. Até porque nos primeiros dias viveram, mas abandonaram, alegando maus tratos, fugindo para avô na vila sede de Nhamatanda é ela onde três filhos estudam. E hoje, a custódia dos filhos também envolve os avós e tios.

É mais fácil encontrar Marcos nas duas mulheres ou na bebedeira ou mesmo no ganha-pão.

 

Situação dos filhos

A filha, segunda sorte, já que a primeira faleceu, segue os passos da mãe. Com 20 anos de idade, Fina já teve dois relacionamentos em dois anos resultando em um filho que chegou a perder vida misteriosamente no interior de Bebedo. Regressou à casa dos avós, mas por força maior está agora com o pai mesmo separado da mãe.

Fina vive com a madrasta na localidade de Bebedo, depois do recente lar que resultou um bebé morto em menos de seis meses. Há quem diz que abandonou o lar por maus tratos do homem, tal e qual a mãe, mas a jovem evita detalhes.

Na zona rural, continuam os desafios da rapariga. Escrever, ler, calcular e língua portuguesa são bichos-de-sete-cabeças para Fina. Campos de produção agrícola, a língua local sena e trabalhos domésticos são áreas que não escapam nos planos diários da jovem que abandonou a 2ª Classe em 2019.

Os restantes irmãos estão em zonas separadas. Dois estão com os avós e um no tio na vila de Nhamatanda. E dois menores estão com a mãe no novo relacionamento.

Os avos e tios são camponeses. São eles que se sentem obrigados a triplicar esforços para alimentar os miúdos enquanto estudam –já vão para 7ª Classe.

Esta descrição por “Profundus” coincide com a campanha dos 16 dias de activismo pela eliminação da violência contra mulher e rapariga, sob lema “UNA-SE! Investir para Prevenir a Violência contra Mulher e Rapariga”, mas a publicação é tempo depois.

Lançada no dia 25 de novembro, a campanha de 16 dias de activismo, terminou a 10 de dezembro, no mundo, mas a reportagem já tinha sido feito, faltando publicação.

Esta é uma parte da realidade a ser encontrada nas famílias no interior de Moçambique, provando a necessidade de se reforçar mecanismos de denúncia, sensibilização ou mesmo de investigação desses factos. Há casos latentes ainda que com pessoas sorridentes ao redor, no fundo há uma realidade que pode sair com tratamento específico. (Muamine Benjamim).

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