Posso morrer hoje ou amanhã, não morrerei como covarde

Por: Júnior Rafael
Por mais que a morte seja uma possibilidade real e cotidiana, há quem viva dobrado diante do medo, da opressão e da injustiça. Eu, não. Se o fim tiver de chegar hoje ou amanhã, que me encontre de pé, olhando nos olhos do mundo, dizendo o que penso, lutando por aquilo em que acredito. Não morrerei como covarde.
O silêncio, em muitos contextos, é um tipo de cumplicidade. Em sociedades marcadas por regimes autoritários, onde a verdade é reprimida e a crítica é punida, calar-se pode significar sobreviver, sim — mas à custa da dignidade. Há quem prefira esse caminho. Há quem escolha abaixar a cabeça, cumprir ordens injustas, obedecer leis desiguais e fingir que tudo vai bem. Eu não sou um desses.
A coragem não está apenas no ato de enfrentar armas ou desafiar poderes. Está, sobretudo, na recusa em se render ao medo. Está em escrever, falar, denunciar, mesmo quando o preço é alto. Está em erguer a voz pelos que não podem mais falar, pelos que foram calados, desaparecidos, torturados ou marginalizados por ousarem sonhar com um mundo justo.
Quando me levanto contra o sistema que oprime, quando denuncio as mentiras institucionalizadas, não estou apenas fazendo política. Estou fazendo humanidade. Porque é humano não se conformar. É humano desejar mudança. É humano resistir.
Não morrerei como covarde porque compreendo que a neutralidade, em tempos de injustiça, é uma escolha — e quase sempre, uma escolha do lado opressor. E eu escolho não ser cúmplice. Escolho me posicionar, mesmo sabendo que minha integridade, meu futuro ou minha vida podem estar em jogo.
Ser corajoso não é ser inconsequente. É ser ético. É saber que a covardia não protege ninguém por muito tempo. O silêncio hoje pode ser o túmulo de todos amanhã. E a história não perdoa os que assistem impassíveis ao sofrimento coletivo.
Se me perguntarem por que não me calei, direi: porque o mundo precisa de vozes, não de sombras. Porque a dignidade não se negocia. Porque o medo não pode ser maior que a esperança. E se o preço da minha coragem for a morte, que ela venha — mas que me leve com a alma limpa, sem correntes na consciência, sem o peso de ter traído meus princípios.
Eu posso morrer hoje ou amanhã. Mas não morrerei como covarde. Morrerei como alguém que, mesmo diante do abismo, se recusou a ajoelhar.
A história está repleta de exemplos de pessoas que viveram e morreram com essa mesma postura. Patrice Lumumba, líder independentista congolês, foi assassinado por se recusar a se submeter aos interesses neocoloniais, preferindo a morte a trair seu povo. Thomas Sankara, presidente de Burkina Faso, ousou sonhar com uma África autônoma e justa — foi executado por forças contrárias à sua visão revolucionária, mas permanece símbolo de integridade e coragem.
No continente americano, Malcolm X tombou por sua luta incansável contra o racismo e pela dignidade do povo negro nos Estados Unidos. No Brasil, Marielle Franco, vereadora e ativista dos direitos humanos, foi brutalmente assassinada por denunciar a violência policial e a exclusão social. Sua voz ecoa até hoje como símbolo de resistência.
Também lembramos Sophie Scholl, jovem alemã da resistência ao nazismo, que ao ser levada à execução em 1943 disse: *”Alguém precisa fazer alguma coisa. O que nós escrevemos e dizemos é acreditado por muitos outros. Eles apenas não ousam se expressar como nós.”
Esses nomes — e tantos outros anônimos — provam que morrer de pé é muito mais digno que viver de joelhos. Eles nos lembram que a vida sem coragem é apenas uma longa morte em silêncio.
Se o fim vier, que eu esteja entre eles.

Discover more from Jornal Profundus

Subscribe to get the latest posts sent to your email.

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

Discover more from Jornal Profundus

Subscribe now to keep reading and get access to the full archive.

Continue reading