O Instituto para a Comunicação Social da África Austral, Media Institute of Southern Africa (MISA Mozambique) apela ao Governo moçambicano para a inclusão na agenda do novo Governo moçambicano, nos próximos cinco anos (2025-2029), preocupações relacionadas à liberdade de imprensa, direito à informação e regulação do sector dos ‘media’.
No ofício enviado na última quinta-feira aos órgãos de soberania do Estado Moçambicano, o MISA reforça a necessidade de um compromisso sólido por parte dos três poderes nomeadamente, Executivo, legislativo e Judiciário, na promoção de um ambiente mediático livre, seguro e democrático, conforme a Constituição da República e os padrões internacionais
O MISA Moçambique destaca os seguintes pontos críticos:
Regulação do sector
O mandato anterior produziu duas propostas de lei, uma de Comunicação Social (a substituir a lei de imprensa) e a outra de Radiodifusão (que vem responder ao vazio de regulação da rádio e televisão). Estas duas propostas chegaram a ser agenda de debate no Parlamento, tendo sido adiada por duas ocasiões, devido aos problemas detectados nas duas propostas de lei. O Governo e o Parlamento têm na sua posse a fundamentação dos diversos sectores da sociedade sobre os problemas das duas leis e as propostas dos caminhos a seguir para terem os padrões democráticos de regulação do sector e que responda ao contexto da digitalização, de garantia da independência dos ‘media’, sobretudo do sector público, a sua gestão profissionalizada, a despenalização dos crimes de imprensa, a carteira profissional dos jornalistas e outros;
A existência de um conjunto de leis no ordenamento jurídico nacional que atentam contra as liberdades de imprensa e os direitos de liberdade de expressão que deverão ser revistas e/ou mesmo abolidas, nomeadamente: a Lei n.º 12/79, de 12 de Dezembro (Lei do Segredo do Estado), Lei número 19/91, de 18 de Agosto (Lei de Crimes Contra a Segurança do Estado), Lei n.º 16/2012, de 14 de Agosto (Lei de Probidade Pública). O MISA possui diversos estudos e fundamentações sobre os problemas existentes nestas leis;
Sobre os processos eleitorais e políticos, Moçambique ainda não dispõe de uma legislação específica que regule a implementação do artigo 49 sobre os Direitos de Antena, de Resposta e de Réplica Política, mesmo que haja certas disposições na Lei de Imprensa sobre a matéria e na Legislação Eleitoral. A importância deste comando constitucional requer que seja operacionalizado por uma lei ordinária específica;
O MISA trabalhou em colaboração com o Instituto Nacional de Tecnologias de Informação e Comunicação (INTIC), anteriormente tutelado ao Ministério da Ciência e Tecnologia, Ensino Superior e Técnico Profissional com o objectivo de desenvolver os “drafts” das propostas de lei de Protecção de Dados Pessoais; Cibercrimes e Segurança Cibernética. O MISA considera que o País está muito atrasado na regulação sobre as questões de digitalização, havendo urgência de garantir uma maior celeridade do processo;
A Migração Digital da TV, mesmo tendo sido declarada finalizada pelo Governo, ao longo do mandato anterior, possuiu diversas lacunas e vícios; sobretudo por ausência de um quadro regulatório e ter sido adoptado um modelo de gestão de distribuição pública de conteúdos, por uma empresa privada, mas com responsabilidade públicas, a TMT – Empresa de Transporte, Multiplexação e Transmissão. O MISA tem trabalhado nestas matérias e possui um estudo e fundamentação muito bem desenvolvida sobre os problemas da Migração Digital, que devem ser resolvidos pelo Estado, uma vez que este modelo institucional da TMT descura as responsabilidades do Estado Moçambicano com o acesso universal à informação. O governo deverá tomar o dossier TMT como sendo um ponto importante a ser revisitado imediatamente.
Ambiente hostil contra as liberdades de imprensa
O ambiente das liberdades de imprensa em Moçambique continua a mostrar-se cada vez mais hostil para os jornalistas. Segundo o Índice Mundial da Organização Repórteres Sem Fronteiras, em 2024, Moçambique caiu da posição 103 em que se encontrava em 2023 para a posição 105 num total de 180 países avaliados. Com as violações excessivas contra os jornalistas no período pós-eleitoral, o índice sobre as liberdades de imprensa em Moçambique poderá piorar em 2025. Com isso, o MISA considera que:
A Procuradoria deve garantir a investigação e o correcto tratamento dos crimes contra jornalistas que, em diversas circunstâncias, são denunciados e participados pelo MISA, junto da instituição. Em muitos casos, as participações do MISA não são investigadas e/ou instruídas para que os violadores das liberdades de imprensa possam ser responsabilizados perante a justiça;
As Forças de Defesa e Segurança, em particular a Polícia, e alguns governantes são os mais visados nos relatórios do MISA sobre violações das liberdades de imprensa. O governo deverá ter uma agenda clara de capacitação destes grupos, por forma a respeitarem o trabalho dos jornalistas e as liberdades de imprensa, podendo contar com a colaboração das organizações internacionais especializadas e do MISA Moçambique;
Deverá haver uma agenda de diálogo com a sociedade civil por forma a realizar um trabalho.
Direito à informação
Mesmo que a Lei do Direito à Informação (34/2014) estabeleça obrigações claras para a disponibilização proactiva de informação, a criação de salas de consultas e departamentos especializados para lidarem com matérias, o MISA tem notado, desde a aprovação da lei, um baixo nível de investimentos do governo e da devida valorização dos actores da justiça para que tal se efective e, por outro lado, a prevalência de uma cultura de secretismo nas instituições do Estado, colocando em risco os objectivos sob os quais o Estado aprovou a Lei do Direito à informação. Com isso, o MISA considera fundamental:
Investir mais recursos no Centro Nacional de Documentação e Informação de Moçambique (CEDIMO) para ter recursos e planos de trabalhos que permitam cumprir com as funções que lhe são consignadas pela lei 34/2014 e o seu respectivo regulamento;
A educação dos funcionários e agentes do Estado e das entidades abrangidas pela Lei para que a possam respeitar;
A alocação de recursos humanos capacitados e materiais para a implementação da lei e do regulamento, sobretudo na criação de páginas webs, salas de consulta e arquivos para garantir e facilitar o acesso à informação;
A produção de informação regular para os informes do Provedor da Justiça no Parlamento e a devida prestação de contas sobre a implementação da Lei;
A correcta responsabilização dos agentes e entidades que sonegam a informação requerida nas entidades abrangidas pela Lei.
O MISA Moçambique manifesta disponibilidade para continuar o diálogo e colaborar com o Governo, Parlamento e Judiciário na construção de um sector de ‘media’ forte, independente e transparente, essencial para o desenvolvimento democrático do país. (Profundus).