Em um mês e alguns dias, a vila municipal de Nhamatanda somou cerca de sete assassinatos. Dois irmãos mortos por suposto fogo posto numa residência (05.06.2024); outro crime foi a catanada a um guarda (na semana de 20.06.2024); mãe e filho mortos (04.07.2024) e na mesma semana – um assassinato no 5° bairro – 25 de Junho, e no sábado (22.07.2024) e na Segunda-Feira (22.07.2024), foi achado um corpo de uma mulher.
É estranho num único distrito que tem ESAPOL, PRM e SERNIC ao mesmo tempo. A impressão que se tem é a de que todos juntos e operativos, Nhamatanda seja o mais seguro, pelo menos na província.
Os assassinatos mais conhecidos são os que foram registados na vila municipal. Se contado com os da localidade, podem motivar números mais assustadores. Há uma explicação razoável disso: ou o modus operandi das autoridades não é suficiente, inoperância ou mesmo as tácticas usadas já são ultrapassadas já que os crimes evoluem, desde inteligência, recursos, disponibilidade, estratégias de comunicação até colaboração com a comunidade, sanção, etc.
Vulnerabilidade do distrito
Os assassinatos de mulheres deram mais destaque em 2022 na cidade da Beira, capital provincial. Depois de uma manifestação da Sociedade Civil, dois dias depois, o SERNIC apresentou 10 supostos envolvidos por terem sido encontrados com os bens das vítimas.
O cenário passou para a cidade de Dondo, principalmente pata os moto-taxistas. Em tão pouco tempo passou para Nhamatanda, o distrito com muitas saídas e entradas.
Nhamatanda tem furos. Ao norte do distrito, existe a via Metuchira ligando a Gorongosa e a localidade de Matenga pela EN1 e EN6; ao sul, existe o Posto Administrativo de Tica, para Buzi, dando estrategicamente acesso ao Sul de Moçambique. Deixando a via de Tica, existe a de Chiadeia, Chirassicua, Macorococho, querendo para o Sul de Moçambique ou mesmo para província vizinha de Manica. A fácil via com policiamento é pela EN6. E nas comunidades, o policiamento comunitário quase que não se faz sentir, até porque reclamam de equipamento de trabalho.
Só na vila de Nhamatanda, existe a via Praça dos Namorados dando acesso ao aglomerado de instituições do Estado até a zona de Complexo 2020, por 5° bairro-25 de Junho. Naquela faixa, a iluminação pública é outro assunto. Ainda na vila municipal, pelo 9° bairro – Eduardo Mondlane, existe conexão com Haluma-EN6 alternativa, sem policiamento.
Em Nhamatanda, por vezes, antes de assassinarem, os bandidos deixam cartas em locais públicos, ameaçando fazer vítimas numa zona, mas, actuam noutra, tal como foi antes da vítima do passado sábado.
O corpo da jovem Júlia foi achado numa cabana, com sinais de violação sexual e agressão, sendo que tratava-se de uma das três que “vendia” prazeres.
Assassinatos recentes só no 1° bairro
O corpo de Júlia foi encontrado numa casa de banho abandonada. Em vida, ela fazia parte do grupo de três mulheres que saíram de Muda, dentro do distrito de Nhamatanda para a vila sede municipal. As três jovens faziam actividade de rotina (prostituição) nos prostíbulos da vila municipal e regressavam no dia seguinte a Muda. O lugar mais conhecido para encontros é nas bebedeiras nas proximidades da famosa Typoia.
A jovem, evitando expor nomes aos jornalistas, até pelo tipo de actividade dela (prostituição), contou que foi a primeira a conseguir cliente. As restantes, uma delas agora morta, estiveram à espera de ciente. Já no dia seguinte, o telemóvel da vítima não chamava. Não tardou, ouviu que perdeu a vida e confirmou no terreno. Na mesma zona, residem agentes da polícia.
São jovens com caras apreciáveis que mereciam estar a cuidar de filhos ou maridos ou mesmo projectos de empoderamento, mas, a realidade comportamental e criminal obriga as autoridades de Nhamatanda a tomarem medidas exemplares.
Júlia é uma das vítimas que deixou quatro filhos a serem responsabilizados pelos avos.
O facto de Nhamatanda ter o maior número de vítimas mulheres que são descobertas no dia seguinte em obras abandonadas, fortifica a aproximação das verdades descobertas durante a investigação do “Profundus”, as quais foram publicadas no Profundusmz.com “Prostituição: Um passo de assassinatos de mulheres em Nhamatanda?”
A vila municipal de Nhamatanda já é vulnerável que desmotiva andar de noite, principalmente, em zonas de maior aglomerado de residências e matas, como explica Délcia – aluna do curso nocturno.
Délcia falava sobre o recente caso de assassinato que envolve outra jovem cujo corpo foi descoberto numa casa em construção no mesmo bairro onde foi encontrada Júlia no sábado.
Para Délcia deveria haver mais policiamento. “Que reforcem mais a segurança”.
Délcia está indignada. Nhamatanda tem muitos agentes da “Polícia” [ESAPOL, SERNIC e PRM], mas não estamos a ver segurança“.
Délcia sugere que se há patrulha, que também se faça nas “zonas e nas casas” não apenas onde tem iluminação pública.
Já o chefe da Unidade C do 1° bairro, Filipe Francisco, conta que o policiamento comunitário deixou de existir porque não havia “incentivo”.
Quando havia policiamento comunitário, não havia esse tipo de casos. Agora os bandidos fazem sem medo, manchando o bairro.
O corpo em estado avançado de decomposição foi descoberto com crianças que estavam a jogar “mata-mata”, brincadeiras da zona. Ao lançar a bola, a outra foi levar naquela obra, mas, regressou “traumatizada a chorar” depois de ver a jovem morta.
No local, também foram encontrados documentos quatro documentos (2 BIs e 2 Cartões de eleitor). Mas pelo estado avançado de decomposição do corpo, tornou difícil reconhecer a cara da vítima pelo menos naquele momento de descoberta. Coincidentemente, o outro corpo foi encontrado no dia do funeral de Júlia.
Algumas verdades descobertas
A vila-sede do distrito tornou-se um ponto de encontro de dezenas de mulheres, na sua maioria jovens que procuram o sustento através do sexo. Entre elas, estão as arrependidas e as gananciosas.
Na vila sede de Nhamatanda, a base é pela EN1-EN6. Por aquele corredor, há sexo sem compromisso, é por dinheiro ou mesmo por diversão. Há tantas mulheres de Zimbabué, de Inchope (cruzamento entre as províncias de Sofala e Manica-centro de Moçambique), de Muxúngue – direcção ao sul do país, de Metuchira, de Lemego, de Tica, de Chirassicua, de Chiadeia – interior de Nhamatanda e da vizinha Gorongosa.
Maioritariamente, os autores das agressões e roubos são indivíduos que se fazem de clientes. “Houve uma vez que um cliente me ligou e pediu que fosse ao encontro. Depois do trabalho, deixou-me sozinha. Apareceram os amigos dele, querendo fazer [sexo] de borla sem o meu consentimento. Consegui fugir, mas arrancaram-me dinheiro, chinelos e relógio”, conta outra jovem de 23 anos, acrescentando que: “há semanas calhei com um cliente que me levou até o 5º bairro, dizendo ser obra dele. Insistiu [em manter relações sexuais], não suportei. Ele parecia estar possuído. Já me arrastava como se fosse animal em cima de restos de cimento naquela obra”, conta a jovem. “Não apresentei o caso à polícia, é vergonhoso, às vezes saímos com txuyas”.
Algumas viram-se obrigadas a se responsabilizar os filhos frutos de relações falhadas. Há até comerciantes que ganhavam “abaixo”. Conciliam as actividades, de dia e de noite – o foco é dinheiro. Algumas alegam dedicar-se ao trabalho de sexo para sustentar as suas famílias ou curtir a “life”, não interessa o amanhã.
Cada uma com as suas motivações, algumas semelhantes outras não. O que não querem é viver na rua com tanta “potencialidade” (corpo e sexo) como se auto-avaliam. Mas neste trabalho, há episódios de violência, estigma e agressões.
“Depende de cada um usar preservativo. Mas eu prefiro usar sempre que consigo um cliente, independentemente, do preço. A saúde, em primeiro lugar”, reconhece Amina, outra jovem.
Tal como o caso recente de assassinato de mulher, os corpos das vítimas são descobertos na manhã seguinte.
Nas noites, algumas mulheres fingem de bêbadas. É uma táctica para estar no mercado sem receio. Nas bebedeiras ali, entre a via principal da que dá acesso a Praça dos Namorados, Terminal de chapas e Mercado grossista Nzero, um olhar de uma mulher ou homem, facilmente pode ser um sinal de pretensão. Assim vai a vida de algumas com saias curtas de panos leves ou colantes que decalcam o corpo e homens apreciáveis por dinheiro, em Nhamatanda. Entretanto, deixam luto, medo e detenções, desafiando a autoridade.
Enquanto isso, alguns chefes estão mais preocupados com as suas construções, compra de talhões, trabalho do Gabinete e poucas vezes no terreno próximo do pacato cidadão. Consequentemente, Nhamatanda tem entradas e saídas sem o reconhecível policiamento comunitário, segundo as comunidades.
Em 2022, Beira chegou de implementar a recolha obrigatória, actuando principalmente, em locais estratégicos, diferente de Nhamatanda único distrito com tanto potencial da ESAPOL, SERNIC e PRM.
Os formados na ESAPOL são “máquinas”, actuam em todo país nas diferentes áreas até contra a insurgência em Cabo Delgado. Aliás, a ESAPOL também faz reciclagem de agentes da Polícia em diferentes cursos. (Profundus).